FAUP ou o melhor sítio para aprender a ganhar um Pritzker
11 ABRIL 2011 701 VISUALIZAÇÕES COMENTAR
O i foi à Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto para perceber de que é feita a única escola em todo o mundo que gerou dois vencedores do prémio maior da arquitectura, Siza Vieira e Souto de Moura
Será dos alunos ou dos professores? Do método de ensino? Do edifício? Da cidade? Do clima? Porque será que a Faculdade de Arquitectura da Universidade do Porto (FAUP) é a única no mundo a ter formado dois prémios Pritzker? Fomos até lá para tentar descobrir e percebemos que não há uma resposta, há muitas.
João Pedro Xavier, vice-director da FAUP, começa por não esconder o “enorme orgulho” que a instituição sente com a atribuição do Prémio Pritzker ao arquitecto Eduardo Souto de Moura, para logo em seguida centrar o discurso nos indivíduos e não tanto na escola.
As “três personagens de excepção” que marcaram definitivamente a vida da FAUP são as grandes responsáveis pelo caldo criativo que se vive entre aquelas paredes, desenhadas e projectadas por Siza Vieira, também galardoado com o prémio máximo da arquitectura, em 1992.
“A diferença que existe na escola do Porto vem de uma reforma que começou com o mestre Carlos Ramos e que apanha Fernando Távora, Álvaro Siza Vieira e Eduardo Souto de Moura”, sentencia João Pedro Xavier. A relação entre o mestre e os seus discípulos traça uma “linha de continuidade” que trilhou o caminho de sucesso desta escola e influenciou o seu método de ensino. “A relação de grande proximidade entre os professores e os alunos, quase como se de um ateliê se tratasse”, fomenta o processo criativo e uma reflexão acurada do quotidiano, permitindo que a obra nasça com características que são hoje associadas à chamada “escola do Porto”. “Mais do que sobriedade, podemos falar de economia de meios. Uma forma inteligente de abordar as questões e de resolver os problemas. A escola do Porto foge ao espectáculo, ao show-off”, explica o vice–director, ressalvando que “fazer uma casa não é o mesmo que fazer um estádio, e o impacto de um e de outro terá, necessariamente, de ser diferente”.
Esse legado passa de professor para aluno de uma forma natural e fluida. Mas nenhum deixou tantas marcas em João Pedro Xavier como Souto de Moura. Agora, sem o blazer e a gravata condizentes com o cargo de responsabilidade que ocupa, o vice-director volta aos bancos de escola e lembra os tempos em que Souto de Moura foi seu professor. “O melhor professor de Projecto que alguma vez tive.” Xavier lembrou a “enorme inteligência” e o “grande empenhamento” do arquitecto, que este ano regressou à FAUP como professor catedrático convidado. Além das duas aulas magistrais que já deu, tem programado um workshop de Projecto a começar no dia 11 de Abril. É ainda regularmente chamado a integrar a crítica de trabalhos de Projecto.
Outro dos traços distintivos que marcam o ensino nesta instituição é a cultura do desenho. Aqui, o desenho é usado como “um instrumento de conhecimento da realidade”. “No desenho hierarquizamos as coisas, funciona como um instrumento muito pessoal de indagação da realidade”. O desenho e o esquiço, aliados à execução de maquetas, “é uma constante na nossa metodologia”. O ensino do desenho é muito exigente e os estudantes da FAUP estão apetrechados para o usar “como conhecimento, mas também como procura”.
Emprego só para alguns Alex Georgiev e Ana Assunção têm pena de não poder usufruir do conhecimento do prémio Pritzker de 2010. As aulas que dá agora “são só para os alunos do quarto ano”. Os dois frequentam o terceiro ano e, quando lhes perguntámos o que é que esta escola lhes dá de diferente, Ana responde, prontamente, “noites sem dormir”. Apesar do sorriso que acompanha a afirmação, a verdade é que são unânimes a dizer que o curso é “muito exigente”, não tanto por causa dos professores, mas porque “os alunos querem sempre superar-se”. “Queremos acompanhar o nível uns dos outros, queremos sempre estar entre os melhores do ano”, assegura Alex, de 21 anos.
Ana, 20 anos, tem uma irmã gémea que estuda Medicina. “Ela tem muito mais tempo livre do que eu. Nem se compara”, garante. Talvez por isso, os dois estudantes pensaram em desistir no primeiro ano. Estão orgulhosos com o Pritzker ganho por Souto de Moura, e o prestígio que esse galardão traz, mais uma vez, à FAUP pode revelar-se como um factor que joga a seu favor. “Quando quisermos arranjar trabalho é uma mais-valia dizermos que tirámos o curso aqui.”
Emprego é “o tema difícil”. Ambos têm o optimismo próprio de quem ainda está na faculdade, mas não deixam de parte um discurso mais realista. “Aqui vai ser difícil. Se não arranjarmos trabalho em Portugal, vamos para fora.”
A FAUP tem cerca de mil estudantes e todos os anos saem perto de 150 mestres. João Pedro Xavier diz sem hesitar que “não há, no imediato, emprego para todos”. A taxa de empregabilidade da faculdade ronda os 60%, um número que o vice-director diz que pode melhorar, mas não nas condições actuais. “Estamos a viver uma altura muito difícil. Não há trabalho nem para os grandes gabinetes de arquitectura.” É o reflexo da depressão que se vive no sector da construção, e que acaba por ser transversal. “Só para lhe dar um exemplo, Norman Foster [arquitecto inglês que projectou, entre outras obras, o novo estádio de Wembley e a cúpula do Reichstag] fechou o gabinete de Berlim e reduziu extraordinariamente o número de colaboradores em Londres.”
Apesar da crise global, existem exemplos “de portugueses que são associados dos melhores gabinetes do mundo” e isso dá alento aos que cá estão. O Brasil apresenta-se como um eldorado para os arquitectos lusos. “Existe um elo de ligação muito forte e a economia por lá está a florescer”. A necessidade de sair vê-se nas candidaturas ao programa Erasmus. “Temos recebido muitos pedidos para a Alemanha, apesar da grande dificuldade que isso representa.” Na Alemanha não existem aulas em inglês e os estudantes são obrigados a aprender alemão. Os países do Norte da Europa têm também uma procura crescente.
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